Por Tássila Maia
O livro do Gênesis narra que Deus criou o
homem e a mulher. Deu origem à humanidade enxertando nos corpos e corações de
Adão e Eva a masculinidade e a feminilidade, respectivamente, como um dom de
complementariedade que os ajudaria a atingir a meta de todo o gênero humano: o
amor. Desta forma, o plano original de Deus para a mulher incluía a vivência de
sua feminilidade como caminho para realizar-se enquanto pessoa, utilizando-se
das características próprias do gênero feminino para progredir no amor.
Infelizmente, após a entrada do pecado do
mundo, o entendimento do ser humano ficou obscurecido e, assim, a aceitação e vivência
da feminilidade cada vez mais necessitada da ação da graça divina para
realizar-se plenamente. A natureza da mulher, manchada pelo pecado, tornou-se
como que um obstáculo para a compreensão do plano de Deus para ela.
No mundo atual, após a conquista da “tão
sonhada” emancipação feminina, os frutos podres do feminismo radical se
manifestam. Lançando fora a complementariedade dos sexos e suplantando-a pela
competitividade entre homem e mulher, diversos estudos já apontam para uma
crescente infelicidade entre mulheres de todas as idades. Facilmente se conclui que a ascensão
do feminismo dificultou para as mulheres – até mesmo para as
cristãs – a percepção da feminilidade como via de autorrealização e, mais
ainda, como caminho de salvação. “Elas se
deixaram convencer que a feminilidade significava fragilidade”, aponta
Alice von Hildebrand, doutora em filosofia pela Fordham University. Tal concepção deu origem a uma busca por imitar
as características masculinas, desencadeando, assim, uma geração de “mulheres
masculinizadas”, não no sentido superficial, como se isso se limitasse ao
vestuário ou ao modo de falar, mas no sentido profundo de que as mulheres
parecem estar menosprezando sua própria feminilidade. “O mundo atual acha-se totalmente desestabilizado porque a mulher não
sabe mais quem ela é. Mais do que nunca, hoje se coloca de modo crucial o
problema de sua identidade e de sua missão”, afirma a escritora francesa Jo
Croissant, no início de seu livro “A
mulher sacerdotal”.
Diante deste dramático quadro, onde encontrar
um modelo, uma inspiração para a redescoberta da feminilidade cristã?
A resposta não poderia ser outra... Em Maria,
a Virgem de Nazaré, o gênero feminino encontra a plenitude das virtudes que lhe
são próprias. Nela, as mulheres possuem o seu seguro referencial. Escreve o
Papa João Paulo II: “A Igreja vê, em
Maria, a máxima expressão do ‘gênio feminino’ e encontra n'Ela uma fonte
incessante de inspiração”. E bem resume Santa Teresa dos Andes: “A Santíssima Virgem é o modelo mais
perfeito de nosso sexo”.
Algumas características virtuosas da Virgem
Mãe de Deus merecem ser citadas como exemplos de conduta para o resgate da
feminilidade cristã:
Receptividade
à graça divina
Para ser uma mulher segundo a vontade de
Deus, é necessário deixar-se modelar por esta Santa Vontade, ser receptiva à
graça. Tal receptividade não significa passividade, mas sim confiar-se sem
reservas ao desígnio divino. Sobre este ponto, comenta Alice von Hildebrand: “A mulher tem uma grande vantagem sobre o
homem, ela é receptiva e religiosamente falante, receptividade é uma virtude
crucial. A Santa Virgem nos ensinou quando Ela disse na Anunciação ‘faça-se em
mim segundo a Vossa Palavra’. Ela não estava realizando nada, ela apenas disse:
‘faça-se’. Em outras palavras, ela era receptiva e sua receptividade permitiu
ao Espírito Santo fecundá-la e naquele exato momento o Filho de Deus se
encarnou no seu ventre. Santa Teresa de Ávila e São Pedro Alcântara dizem que
muito mais mulheres que homens recebem extraordinárias graças místicas, e se
você estudar a história do misticismo você ficará surpreso o quanto muito mais
mulheres que homens foram místicos. Por quê? Elas são mais receptivas e você
percebe que, para Deus, nós somos todas mulheres. Um santo se torna um homem
santo porque ele aprendeu a ser receptivo à graça de Deus. ‘Dê-me a mim, Ó
Senhor, eu não consigo fazê-la por mim mesmo’”.
Coragem
Assumir a feminilidade cristã requer coragem.
Os modelos de mulheres apresentados pela sociedade atual não condizem – nem um
pouco! – com o ideal católico. Dessa maneira, a coragem faz-se uma virtude indispensável
para assumir-se mulher sem “conformar-se a este mundo”, como recomendava o Apóstolo.
Estar aberta à vida, aos filhos que Deus enviar, estar disposta a entregar-se
num matrimônio fiel por toda a vida, não submeter-se aos ditames da moda ou aos
padrões estéticos estabelecidos... tudo isso se faz um grande desafio para a
mulher cristã. Maria, ao responder “sim” à vontade de Deus assumiu todas as
consequências de sua decisão. Sabia dos riscos e sofrimentos que tal escolha
poderia causar (a rejeição de José, a incompreensão e até mesmo o
apedrejamento!). No entanto, não hesitou em responder generosamente à sua
vocação.
Silêncio
e discrição
A Santa Virgem ensina a cada uma das mulheres
que a alma, quando cheia de Deus, torna-se amante do silêncio. O Papa Francisco
refletiu, em sua homilia do dia 20 de dezembro de 2013, sobre a relação entre
Nossa Senhora e o silêncio: “Era
silenciosa, mas dentro do seu coração, quanta coisa dizia ao Senhor! (…) Ela,
com o silêncio, cobriu o mistério que não entendia e com este silêncio deixou
que este mistério pudesse crescer e florescer na esperança (…) O silêncio é o
que protege o mistério. Que o Senhor nos dê a graça de amar o silêncio, de
procurá-lo e ter um coração protegido pela nuvem do silêncio". A feminilidade implica também saber preservar o mistério que é próprio da mulher. Ser discreta e silenciosa ajuda a equilibrar as emoções, falar com sabedoria, refletir sobre as decisões a serem tomadas e a comportar-se educadamente, como convém.
Delicadeza
e modéstia
A virtude da modéstia resplandece em Maria, a
“toda bela”. A mulher cristã deve espelhar-se na singeleza desta Virgem para
modelar todo seu proceder. Aprender, com ela, a ser modesta primeiramente no
coração, para assim transbordar essa tão bela virtude em seu exterior. As
vestimentas, os gestos, o modo de falar, de olhar, todo o comportamento da
mulher católica deve estar permeado desta delicadeza que exprime sua dignidade
de filha de Deus. Exorta-nos Santo
Ambrósio: “Tem sempre diante de teus olhos
a pureza, ou, para melhor dizer, a vida de Maria, como um quadro em que
resplandece a perfeição das virtudes. Seja tua vida modelada pela de Maria, e
aprende com ela o que deves corrigir, o que deves evitar, e o que deves fazer”.
Doação
de si mesma
Por fim, a Mãe de Deus, como amou de modo
perfeito, de modo perfeito entregou sua vida em oblação ao Senhor Deus. Esta
oferta total de si, que se realiza de modo concreto no amor a Deus e ao
próximo, manifesta-se de maneira particular na mulher. A gestação e o parto,
por exemplo, são formas muito claras onde essa doação é vivenciada “ao extremo”.
Nestas ocasiões, pode a mulher, de certa forma, afirmar: “Isto é o meu corpo
dado por vós”, como maravilhosamente assinala Kimberly Hahn em seu livro “O amor que dá vida”. A feminilidade
precisa ser assumida como verdadeira alegria em dar-se, consumir-se por amor.
Não foi assim toda a vida de Maria?
No instante em que cada mulher cristã
redescobrir o valor de sua feminilidade, espelhando-se em Maria, a quem Deus
constituiu Rainha do Céu e da Terra, superior aos anjos e a todos os santos,
neste momento acontecerá a verdadeira “revolução feminina”: aquela capaz de satisfazer o
coração porque encontra-se plenamente alinhada ao plano amoroso de Deus.