Por André Krupp e Tássila Maia
A Igreja não é simplesmente um conjunto de
templos ou um conjunto de normas. A Igreja é um grupo de pessoas que, unidas
pelo Batismo, tornam-se o Corpo Místico de Cristo. Ou seja, todos os batizados
são chamados a “ser Igreja” porque, de fato, o são. Em algumas vocações, como a
religiosa ou a sacerdotal, fica mais claro este “ser Igreja” no dia a dia. Mas
para os leigos, casados, que constituem uma família, essa realidade pode
parecer um pouco distante. Como se pode “ser Igreja” dentro da própria casa? Na
prática, como fazer da própria família uma Igreja Doméstica?
Este texto tem a intenção de ilustrar alguns
pontos práticos a serem trabalhados para facilitar o cumprimento deste
objetivo.
Vida de
Oração
Quando falamos em “ser Igreja”, primeiramente
falamos de vida de oração. Seja na vida pessoal, na vida paroquial ou dentro da
família. Se não conseguirmos introduzir momentos de oração com toda a família
reunida na rotina do lar nunca iremos conseguir transformá-lo numa Igreja
Doméstica.
O “conteúdo” da oração pode ser a própria
vida familiar: suas dores, preocupações e alegrias. A recitação do terço de
Nossa Senhora, a leitura orante da Palavra ou a realização de uma novena podem
ser boas formas de ganhar intimidade espiritual. O mais importante é manter a
família sempre unida em oração.
Para ajudar nesta tarefa “é muito aconselhável que as famílias, por mais simples que seja sua
casa, reservem um espaço (mesmo na parede apenas), um singelo ambiente, adequado
para oração em família. Pode até ser um dos quartos, a sala, ou mesmo a
cozinha. Um ‘cantinho de oração’, com símbolos religiosos, a Bíblia, o
Crucifixo, o Rosário. Aí os filhos aprenderão a respeitar e a se relacionar com
o sagrado, a rezar e a estar com Deus. As crianças deveriam ‘sugar com o leite
materno’ o amor de Deus, o louvar, agradecer, suplicar e glorificar a Deus.”
(Documento 79, CNBB). Facilmente observamos o esforço de muitas famílias
por construir verdadeiros “santuários” para a televisão, empenhando dinheiro e
espaço para que aquele ambiente se torne o mais agradável possível. Ora, será
que não seria justo separar um canto para a TV menos espaçoso e custoso para se
investir em um outro canto mais importante: o da oração? Será que não seria justo,
para com Deus e para com a nossa família, preparar um ambiente agradável e
confortável para a oração? Tudo é questão de prioridade...
Ajuda preciosa na vida de oração é também o
silêncio, não somente durante a oração, mas também ao longo do dia. É preciso
abandonar a “síndrome da TV ligada”, o vício de sempre ter “um barulhinho de
fundo”. Desligar (ou não ligar tanto) a TV, o rádio e o computador não faz mal
a ninguém! Pelo contrário, propiciar momentos de silêncio acalma o coração e a
mente, preparando-os para a oração. Além disso, ver menos TV também nos poupa
tempo para que possamos fazer coisas mais úteis, permite um maior diálogo entre
as pessoas e polui menos a nossa imaginação com cenas inconvenientes.
É muito importante também manter a disciplina
na vida de oração, não burlando ou adiando os horários combinados. Neste ponto,
a maior responsabilidade se coloca sobre os pais, pois é deles a incumbência de
dar o exemplo. O Papa João Paulo II relatou, certa vez: “Meu pai foi uma pessoa
admirável e quase todas as minhas recordações de infância e adolescência
referem-se a ele. O simples fato de o ver ajoelhar-se teve uma influência
decisiva nos meus anos de juventude. Era tão severo consigo próprio, que não
necessitava de o ser com o seu filho: bastava o seu exemplo para ensinar a
disciplina e o sentido do dever”.
Orar e levar os filhos à oração é a primeira
atitude na construção de uma Igreja Doméstica.
“Sentire cum Ecclesia”
A Igreja tem o seu ritmo próprio. Ao longo de
todo o ano litúrgico, meditamos os momentos mais importantes da vida de Jesus.
Do seu nascimento à morte, as alegrias e as dores, a Transfiguração, o
ensinamento dado aos apóstolos, sua Paixão, Ressurreição, Ascensão, a vinda do
Espírito sobre a Igreja e tantos outros acontecimentos. Tudo isso para reviver,
junto com Cristo, todos estes momentos.
A vivência dos diferentes tempos litúrgicos
não deve restringir-se somente para as celebrações na igreja, mas deve
estender-se para os lares cristãos. É preciso “sentir com a Igreja”. Por exemplo:
- Celebrar em casa, com boas refeições e
muita alegria, as festas dos grandes santos e as solenidades de Nosso Senhor e
da Virgem Maria. Fazer “virar tradição” as comemorações familiares das grandes
festas da Igreja, promovendo, por exemplo, o “churrasco de São José” ou “a
festa mexicana de Nossa Senhora de Guadalupe”... Enfim, o que a imaginação e a
devoção particular de cada família mandar!
- Celebrar de forma especial, ainda que
simples, os onomásticos (santos xarás) dos pais e filhos.
- Viver o advento e a quaresma com piedade e
devoção, respeitando as normas estabelecidas pela Igreja (jejum, recolhimento,
obras de caridade, penitência), preparando-se, mais profundamente, para as
grandes festas da Natalidade e Ressurreição do Senhor.
- Vivenciar a Semana Santa como um “grande
retiro” em família. Este tempo precioso da Igreja não pode, de forma alguma,
ser encarado como um “feriadão”, uma oportunidade de descanso e lazer. Ao
contrário, deve ser vivido intensamente, mergulhando no mistério pascal de
Cristo. Faz bem não só participar das ações litúrgicas, como também respeitar a
espiritualidade do dia dentro de casa. Por exemplo: na Sexta-Feira da Paixão
celebramos a morte de Nosso Senhor e a Igreja é como que imersa num clima de
extremo silêncio e recolhimento. Assim, pede às famílias que realizem o jejum e
a abstinência de carne, como forma de penitência. Porém, boa parte das famílias
católicas preparam um verdadeiro “banquete” neste dia à base de bacalhau e
outros peixes. Será que essa seria uma atitude realmente conveniente? No dia em
que se celebra a morte de nosso Deus, convém “fazer festa”? Não. “Sentir com a
Igreja” implica trazer para dentro do lar uma atmosfera semelhante a que é
vivenciada nas celebrações. Dessa forma, devemos guardar o jejum e a penitência
na Sexta-Feira Santa para, com a Igreja, explodir de alegria na Ressurreição.
No sábado à noite, após a Vigília Pascal, convém preparar uma grande festa,
assim como no Domingo de Páscoa: convidar os parentes, comemorar o dia todo...
alegrar-se como Igreja Doméstica!
- Imprimir um ritmo semanal de acordo com a
espiritualidade própria do dia, a começar pelo Domingo, dia do Senhor. O
domingo deve sempre ser um dia de grande alegria, de boas refeições, passeios e
convivência familiar, além, é claro, da participação da Santa Missa com fé e
entusiasmo. Na segunda-feira pode-se reservar um tempo para a oração pelos
fiéis defuntos. Na quarta-feira, pode-se rezar com devoção a São José. Às
sextas-feiras, é muito aconselhável meditar a Paixão do Senhor e observar a
abstinência de carne. O sábado pode ser dedicado à devoção à Virgem
Santíssima... Criar uma rotina semanal facilita a vivência da espiritualidade e
gera muitos frutos na vida familiar.
Conhecer
a fé
A transmissão da fé é um dever dos pais: “a fecundidade do amor conjugal não se reduz
apenas à procriação dos filhos. Deve também estender-se à sua educação moral e
à sua formação espiritual. O papel dos pais na educação é de tal importância
que é impossível substituí-los. O direito e o dever da educação são primordiais
e inalienáveis para os pais” (Catecismo da Igreja Católica, § 2221). Para
transmitir a fé, no entanto, é necessário, primeiramente, conhecê-la. A busca
pela formação constante, através da leitura do Catecismo e de outros documentos
da Igreja, se apresenta como tarefa indispensável para o cumprimento do dever
de educar. Reservar um tempo durante a semana para o estudo poderá se
transformar numa grande oportunidade de crescimento para os pais e uma
catequese para os filhos.
Por fim, ser Igreja Doméstica significa
também ser missionário e transmitir, a partir da própria vivência, o amor de
Deus a todas as outras famílias: “Cada
família comunicará generosamente com as outras as próprias riquezas
espirituais. Por isso, a família cristã, nascida de um matrimônio que é imagem
e participação da aliança de amor entre Cristo e a Igreja, manifestará a todos
a presença viva do Salvador no mundo e a autêntica natureza da Igreja, quer por
meio do amor dos esposos, quer pela sua generosa fecundidade, unidade e
fidelidade, quer pela amável cooperação de todos os seus membros” (Gaudium et
Spes, 48).
*Algumas famílias compartilham na rede sua
experiência enquanto Igreja Doméstica. Vale a pena conhecer!
Deus abençoe as nossas famílias!
Nenhum comentário:
Postar um comentário